sexta-feira, 9 de março de 2012

Cinderela no Sambódromo


Seus olhos verdes, vivos, brilhantes e arregalados mantinham-se fixos, imóveis diante da beleza que escorria ritmicamente ao som da bateria da escola de samba beija-flor. O coração batia acelerado aos compassos dos tambores e instrumentos que entoavam uma canção que mais pareciam uma oração em celebração à vida. Nos seus pensamentos desfilava como em câmara lenta as passagens de sua vida, analogamente como as alas da escola de samba. As cores, luzes, brilho, alegorias, manejos e danças de rara beleza e a criatividade lhe possibilitava dar um novo colorido a sua história, enriquecida agora de sons e adereços, pela magia do entoar do batuque da bateria acompanhado ao canto das pessoas. A cada escola que plainava na avenida, mais um episódio de sua vida derretia-se em lembranças e recordações, um passado e rico filme que ela adornava com a sua recriação e fantasia, como se a criar para cada uma delas um novo enredo enxertado naquela multidão a bailar e cantar como uma grande opera oportuna.

Lembrava-se de suas vivencias interioranas, do seu teatro em cima do balcão da torrefação, em cortinas de lençol, presas em fios de arame, fantasias de palhas e cetins floridos, adornados com flores do campo e perfumes lavanda. Das danças do circo, do tablado, que tantas vezes a representava em suas brincadeiras infantis, da mulher rumbeira, que trazia sob as nádegas um enorme babado que se arrastava ao chão comparado ao movimento dos repteis, na sua flexibilidade e leveza. Dos desfiles de sete de setembro, dia da bandeira, da baliza que bailava ao som da bandinha; do circo de Gozobinha que a deixa entusiasmada frente ao trapézio, fazendo-a voar; da alvorada, que a bandinha colegial, entoava na madrugada anunciando um dia festa; do teatro da escola onde assistia às peças ali representadas pelos estudantes e dos seus ensaios dominicais. Na sua mente também ocorrida um grande desfile, o seu espetáculo interior, calmamente revivenciado.

Seus pensamentos volitavam, suas recordações revividas! Quem poderia previr que um dia aquela menina pudesse estar diante de um dos maiores espetáculos da Terra, onde a criatividade emociona, contagia, o calor do povo inebria e a musica aquece os corações adormecidos pelas dores antigas, mas que revivem as lembranças de alegria e amor pela vida vivida. Que fantástico é poder ver e sentir a capacidade criativa do ser humano. É indiscutivelmente, notadamente ilimitada!!! Imprevisível e surpreendente. A cada escola que se desenrolava a sua frente, era como viver um grande espetáculo, onde o entusiasmo se fazia presente em todas as cenas, numa loucura embriagante. Assim, era transportada a lugares até então nunca visitados por nós, há um mundo de fantasia, ficção e cor, imersos no absurdo!

Que grande revelação!!! Os contos de fadas existem..., basta que acredite neles, reinvente e viva-os... Se presenteie!!!

Socorro Prado

3 comentários:

  1. Texto ricamente descritivo. Uma beleza de cenário. Adorei a forma como escreveu a narrativa!!
    Um bj, escritora!
    :D

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  2. Belíisimo texto. Consegui viajar nas suas palavras e me senti vivenciando as 2 experiências : o sambódromo e o sertão! Adorei!!

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  3. Obrigada Pat, que bom que gostou. bjs.

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