Miragem
Vinha eu, fazendo meu percurso diário pelas ruas da
velha cidade de Barra de Pojuca. Caminhava lentamente, pois a idade já não me
permitia passos tão acelerados, e carregava no peito toda a tristeza de um
velho solitário. Digo “solitário” porque, se fosse sozinho, estaria bem
acompanhado.
Naquele, dia principalmente, meus pés arrastavam-se
pelo chão vagarosamente, e o peso do meu corpo redobrava... O sol estava
causticante, mas a brisa parecia me acariciar. Em frente à praça da igreja, a principal
e mais movimentada daquele lugar, avistei uma menina com vestes rasgadas e
cabelos em desalinho, que sentada na esquina do beco, embalava sua boneca e
cantava uma cantiga de ninar que mais parecia um choro que saia das profundezes
de sua alma.
Aproximei-me, calmamente, e disse-lhe:
- Está sozinha?
Ela nada respondia. Indaguei novamente:
- Você está perdida? Onde estão seus pais?
E nada. Continuava a cantar, fixando o olhar na
encardida boneca de pano. Permanecia distante e impassível. Não resisti. Veio à
vontade de tocá-la, envolvê-la em meus braços. Por um instante, hesitei,
sucumbi ao medo que tomara meu corpo. Por fim, decidi sentar-me junto a ela.
Com muita dificuldade, abaixei-me na calçada para vê-la mais de perto. Havia
sumido!
Socorro do Prado